terça-feira, 21 de julho de 2015

É nos timbres do passado que o futuro é ecoado


   Olá!! Aqui é o engenheiro tecidual. Nesta semana vamos viajar no túnel do tempo. Vamos ver que, embora os grandes avanços na engenharia de tecidos sejam modernos, os conceitos por de trás dessa ciência vem de longas datas, inclusive da mitologia. Veremos que a na história das culturas humanas existe uma preocupação com o bem-estar e a imortalização do corpo ou pelo menos a desaceleração dos processos que levam a um dano nos órgãos ou tecidos. E nada como uma boa ficção científica para aguçar a nossa mente!
   O conceito de totipotência, ou seja, a capacidade de uma célula de originar todos os tecidos do organismo, uma das características do zigoto, já era conhecido no mito hindu de Raktabeej (Rakta= sangue; beej= semente) onde seres mitológicos geravam seus clones a partir de gotas de sangue. Ainda na mitologia, as noções de regeneração tecidual já deviam ser conhecidas por Zeus, que castigou Prometeu por ter roubado o fogo do Olimpo a ser acorrentado ao monte Cáucaso e ter seu fígado devorado por uma águia todos os dias. O fígado, com a capacidade de regenerar, era formado novamente, aumentando o castigo e o sofrimento de Prometeu. Um biorreator, ou seja, uma máquina capaz de fazer crescer células e tecidos fora do corpo humano, já havia sido planejada em outro mito hindu, o Maabárata. A história diz que a mãe de Kaurava, depois de 2 anos de gravidez gerou uma massa de carne, a qual repartiu em 100 partes. Essas partes foram cultivadas em espécies de biorreatores contendo ervas e manteiga, da onde, após mais 2 anos, surgiram os irmãos de Kaurava.
Voltando a realidade, o uso de suturas e linhas, para fechamento de feridas é conhecido desde 10 mil antes de Cristo, como o linho com os egípcios e cabeças de formigas na África do Sul e Índia. Susruta, o pai da cirurgia, já fazia implantes de pele em 2500 antes de Cristo. O Papiro de Ebers, um tratado de medicina do Egito Antigo, datado de 1500 antes de Cristo, mostra que os egípcios usavam uma mistura de fibra de algodão, que funcionaria como um biomaterial; graxa, uma barreira para entrada de micro-organismos; e mel, que funcionaria como um antibiótico, para curar feridas na pele. A primeira prótese em humanos é de uma múmia egípcia de 1069 a 664 antes de Cristo, com um dedão de madeira e couro. Os romanos usavam ferro como biomaterial para ossos. O grego Galeno de Pérgamo usou fios de ouro para sutura no século II. Os maias utilizavam madrepérola em 600 depois de Cristo, como um biomaterial em implantes dentários.
É claro que a descoberta das células-tronco e a combinação destas com os biomateriais deram um salto quântico na engenharia tecidual. As ideias do passado, a realidade do presente e as projeções do futuro nos permite ao menos imaginar uma sala de cirurgia que mais se pareça com uma oficina, onde tecidos e órgãos sejam cultivados para substituir os doentes. E quem sabe assim nos tornaremos como Wolverines da vida real, com uma capacidade ilimitada de regeneração. É como se diz, sonhar não custa nada. Nos próximos posts fique atento para o que já é realidade na engenharia tecidual.
Até mais!! Um abraço biologicamente engenheirado.
Para saber mais: Kaul H, Ventikos Y. On the genealogy of tissue engineering and regenerative medicine. Tissue Eng Part B Rev. 2015 Apr;21(2):203-17.




Múmia egípcia com uma prótese de madeira (acima). Fazenda de órgãos no laboratório de engenharia tecidual do futuro.