Talvez você também tenha ouvido falar das células-tronco de pluripotência induzida, as chamadas iPS, que renderam a pesquisadores japoneses e britânicos o prêmio Nobel de medicina em 2012. O grande barato dessa pesquisa ganhadora do Nobel foi a capacidade de transformar uma célula que não é tronco, como uma célula da pele, em uma célula-tronco, quase que idêntica a uma célula-tronco embrionária. Em breve, discutiremos mais sobre as iPS aqui. Porém, um problema das mesmas é que, justamente por terem a capacidade de formar diversos tipos celulares, é preciso direcioná-las muito bem em laboratório qual destino elas terão. Por exemplo, ninguém quer implantar uma iPS no músculo, e ali se desenvolver um dente, cabelo etc (formando os temidos teratomas - "tumores monstruosos"). Foi então, que em fevereiro desse ano, foi publicado um artigo apresentando as células de multipotência induzida (iMS). Esta nova técnica fez com que células de gordura e osso pudessem ser transformadas em células-tronco multipotentes, ou seja, assim como as células-tronco adultas, isto é, ainda tronco, mas não passíveis de formar a imensa variedade de tecidos que as células-tronco embrionárias conseguem.
Isso foi possível, pois nossas células possuem” memória
celular”. O que é isso? Você pode estar se perguntando: A célula possui neurônios? Claro que não!
Quando falamos em memória celular falamos que a célula mantém a programação
genética para desempenhar uma determinada função. Todas as nossas células são
originadas de uma única célula, o zigoto. Ao longo das divisões celulares o que
ocorre é que as células filhas vão se especializando em uma determinada função
adquirindo um perfil, uma memória celular. É como se as células tivessem
interruptores que ligam ou desligam uma atividade específica nela. Por exemplo,
uma célula de osso deve ser capaz de colocar cálcio nos ossos, uma célula de
músculo deve ser capaz de contrair, e assim por diante. O que os cientistas
fizeram foi deixar as células com os interruptores desligados podendo ser
acionados de acordo com o local na qual essas células são inseridas, resultando
em regeneração tecidual.
A grande vantagem das iMS é que elas se mostraram com
capacidade de regeneração maior que as células-tronco adultas, contribuindo
diretamente para a regeneração tecidual de ossos da lombar, assim como não formaram teratomas, como
as células-tronco embrionárias e as iPS podem formar. Vale lembrar que esse estudo foi feito até agora em ratos e
camundongos. Além disso, para promover essa reprogramação celular os cientistas
usaram um composto conhecido como AZA (5-Azacytidine), já normalmente usado
para tratar doenças sanguíneas, e uma molécula conhecida como PDGF-AB (fator de
crescimento derivado de plaquetas-AB), muito utilizado para cultivar
células-tronco em laboratório. Até então, a forma de se reprogramar as células,
formando as iPS, é utilizando vírus que carregam genes para modificar essas
células, o que também é ainda encarado com cautela por muitos médicos e
cientistas. Ainda será necessário muito trabalho para se verificar se as iMS
poderão ser utilizadas para tratar diversas doenças tais como osteoartrites,
degeneração muscular, injúrias no disco espinal entre outros, além de, quem
sabe, garantir algum grande prêmio aos cientistas australianos que as
descobriram, assim como os cientistas japoneses e britânicos ganharam o Nobel
pelas iPS.
Bom galera, esse foi mais um exemplo de como as
técnicas de terapia celular tem colaborado para o desenvolvimento da engenharia
tecidual e medicina regenerativa.
Um abraço biologicamente engenheirado!!
P.S.: veja esse vídeo do youtube, onde os próprios cientistas
australianos explicam as células iMS. Infelizmente, por enquanto o vídeo
apresenta apenas legendas em inglês =[
Esquema representando a técnica de desenvolvimento de células-tronco de multipotência induzida (iMS) pelos cientistas da University of New South Wales (UNSW) da Austrália. Primeiramente células de gordura são extraídas (1), tratadas com PDGF-AB e AZA (2), de forma que se modifiquem (3) e se tornem as iMS (4). Essas podem então ser cultivadas e possivelmente transplantadas (5) para regenerar tecidos. Imagem adaptada do site theconversation.com